17/05 – Nos últimos anos, redes sociais e sites especializados tornaram-se o ambiente mais procurado por consumidores para reclamar e, em alguns casos, resolver problemas decorrentes da compra de produtos e serviços.
Regras de defesa do consumidor não são conhecidas pela maioria
Mas a visibilidade trazida pela internet e pelas mídias sociais também tem estimulado abusos de consumidores de má-fé.
Protegidos pelo anonimato da internet, em muitos casos, eles tentam obter vantagens das empresas simulando problemas de consumo que nunca existiram.
No portal Reclame Aqui, que registra reclamações de consumidores, 220 mil cadastrados já tiveram seus acessos ao site bloqueados, diante de suspeitas de queixas mal-intencionadas.
A página recebe 300 mil reclamações por mês e já atingiu 7,6 milhões de consumidores no país desde sua fundação, em 2009.
As fraudes mais comuns, segundo Maurício Vargas, presidente do site, envolvem clientes que reclamam de defeito ou má qualidade do produto ou do atendimento, com o objetivo de receber compensações oferecidas pelas empresas Ðgeralmente, produtos ou serviços gratuitos.
Editoria de arte/Folhapress
“Descobrimos um desses casos ao cruzar informações e detectar uma série de reclamações da mesma pessoa, sobre um mesmo restaurante.”
Segundo ele, a prática da rede de restaurantes era oferecer uma refeição de cortesia a clientes insatisfeitos.
“Com medo do dano que essa reclamação pode trazer à sua imagem, muitas empresas acabam atendendo a esse consumidor de má fé”, diz
Vinícius Zwarg, advogado especialista em direito do consumidor, do escritório Emerenciano, Baggio Associados.
“A exposição na internet e nas redes sociais fez aumentar esse temor.”
Apesar de compreensível, esse tipo de política é prejudicial para as relações de consumo no país, segundo Zwarg. “Acaba estimulando que volte a ter esse tipo de prática (de fraude)”, diz.
No lado oposto, outro problema ocorre quando as empresas se tornam mais rígidas ou lentas na análise das queixas trazidas por consumidores, justamente para evitar cair nas “armadilhas” dos fraudadores.
“Se forem criados mecanismos que levem mais tempo para apurar as reclamações, também é ruim, pois prejudica os bons consumidores”, diz o advogado.
Prevenção
No Reclame Aqui, há três anos, uma equipe de sete pessoas foi destacada apenas para identificar possíveis fraudadores que atuam no site.
Os comportamentos suspeitos incluem repetição de reclamações, com casos semelhantes, de um mesmo cadastrado e queixas feitas em um curto intervalo de tempo, diz Maurício Vargas.
“O ambiente livre da internet facilita a troca de informações sobre as fraudes”, diz.
Segundo ele, circula na web um documento, intitulado “manual do consumidor mal-intencionado”, que traz “truques” para enganar empresas e até juízes, nos casos que vão parar na Justiça (geralmente, Juizado Especial Cível, antigo Juizado de Pequenas Causas).
Justiça
Nos casos que vão a juízo, a legislação pode acabar favorecendo o fraudador, pois a obrigação de provar a eventual falsidade da alegação recai para a empresa, em boa parte dos casos.
Segundo o advogado Vinícius Zwarg, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece que o ônus da prova (obrigação de provar a veracidade ou falsidade da alegação) caberá à empresa em dois casos, ambos bastante aplicáveis à relação consumidor-fornecedor.
As hipóteses são quando há verossimilhança dos fatos (as informações alegadas tenham um mínimo de veracidade) ou relação de hipossuficiência, que ocorre quando o consumidor encontra-se em posição inferior à companhia, seja em relação à informação ou condição econômica.
Regras de defesa do consumidor não são conhecidas pela maioria
De São Paulo
O desconhecimento ainda é um inimigo do brasileiro na hora de buscar seus direitos como consumidor.
Apesar de ter uma lei de defesa abrangente e dos esforços recentes do governo em ampliar essa proteção, uma pesquisa inédita mostra que muitos brasileiros ignoram boa parte das regras do Código do Defesa do Consumidor (CDC).
‘Clientes fraudadores’ simulam problemas com produtos e serviços na web
O levantamento do IBRC (Instituto Brasileiro de Relacionamento com Cliente), obtido pela Folha, também mostrou que os consumidores avaliam de forma negativa o cumprimento das regras pelas empresas.
A pesquisa ouviu 2.050 pessoas em 12 capitais, nas cinco regiões do país.
Algumas regras específicas do CDC, considerada por especialistas como uma das legislações mais protetivas ao consumidor do mundo, são totalmente desconhecidas do consumidor.
A pesquisa avaliou o conhecimento sobre dez regras de defesa do consumidor, previstas no CDC e em regulamentações específicas.
Na média, apenas 21% dos entrevistados mostraram conhecimento completo sobre essas normas.
Apenas 18% dizem saber que “cobrança indevida deve ser devolvida em dobro” e só 13% sabem que “pode-se desistir de compra pela internet até 7 dias após entrega”.
Das regras submetidas ao teste, a norma com maior índice de conhecimento (37%) foi “você não precisa contratar seguro de cartão de crédito”.
Para Alexandre Diogo, presidente do IBRC, a ignorância da população sobre os direitos prejudica a evolução das relações de consumo no país.
“Para que o consumidor exija seus direitos e o CDC seja cumprido, ele precisa antes de tudo conhecer a lei”, afirma.
O Plandec, Plano Nacional de Consumo e Cidadania, lançado pela presidente Dilma Rousseff neste ano para ampliar a regulamentação sobre relações de consumo, não deve trazer grandes mudanças nesse sentido, acredita.
“O plano não trouxe iniciativas de educação para o consumo, ações efetivas para educar o consumidor desde criança, na escola.”
Má avaliação
Em uma escala de zero a dez, os entrevistados deram nota 6,5 para o cumprimento das regras de defesa do consumidor.
Apenas 1,1% dos consultados deram a nota máxima nesse quesito. A nota 6 foi atribuída por quase 40% dos entrevistados.
De acordo com o levantamento, os setores com a pior percepção no cumprimento das normas são bancos, telefonia móvel, TV por assinatura, cartões de crédito e banda larga.
Já os melhores avaliados foram cosméticos, bebidas e alimentos, automóveis, seguros e aviação civil.
Na pesquisa, os entrevistados organizaram em uma escala de um a quinze os setores que mais respeitam seus direitos como consumidor –sendo 15 o setor que mais respeita os direitos.
O estudo, porém, também mostra que o consumidor está mais otimista. Para 89% dos entrevistados, houve melhora no atendimento ao direito do consumidor no Brasil por parte das empresas nos últimos anos.(MA)*
Fonte: Folha de S.Paulo / por Fenacon
Escrito por: Marianna Aragão
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