27/05 – Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em recurso repetitivo, reacendeu a polêmica sobre a tributação de juros de mora ou correção. Por unanimidade, os ministros da 1ª Seção entenderam que os contribuintes devem recolher Imposto de Renda (IR) e CSLL sobre os juros recebidos em levantamento de depósito judicial ou na devolução de tributos pela Receita Federal.
Para advogados, o entendimento conflita com pelo menos três decisões – duas em recursos repetitivos – proferidas nos últimos dois anos pela 1ª Seção. “Há uma forte contradição entre os acórdãos”, diz o advogado Francisco Giardina, do escritório Bichara, Barata & Costa Advogados.
Em dezembro, os ministros decidiram, também em recurso repetitivo, que os juros de mora decorrentes das verbas pagas aos servidores públicos por meio do Plano de Seguridade Social (PPS), por serem uma forma de indenização, não deveriam ser tributados pela contribuição previdenciária. Dois meses antes, em outubro, o mesmo colegiado entendeu que incide Imposto de Renda sobre juros de mora recebidos pelo atraso no pagamento de verbas trabalhistas, exceto em situações específicas (veja ao lado).
Na semana passada, ao analisar processo apresentado pela Hering, a 1ª Seção exigiu a tributação pelo IR e CSLL dos juros decorrentes de depósitos judiciais e devoluções de tributos recolhidos a mais ou indevidamente (repetição de indébito). “Não há diferença entre os casos porque o que está em discussão é a natureza dos juros de mora. Não cabe uma interpretação para cada caso concreto”, diz o advogado Carlos Golgo. Os três casos foram relatados pelo ministro Mauro Campbell Marques.
Os advogados da Hering esperam a publicação do acórdão para recorrer da decisão. “Tentaremos novamente convencer os ministros de que não há tributação. Nos dois casos, os juros recompõem o patrimônio da empresa que ficou indisponível em um determinado período”, diz Ana Paula Faria, do escritório Gaia, Silva, Gaede & Associados, que representou a Hering no processo. Na primeira instância e no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Sul do país), a empresa havia conseguido afastar a tributação.
Segundo advogados, o precedente impacta milhares de empresas que questionam cobranças de tributos na Justiça. De acordo com a Receita Federal, de janeiro a abril deste ano, as empresas depositaram em juízo R$ 4,2 bilhões para discutir autuações fiscais na esfera administrativa e judicial. Se há vitória, os contribuintes conseguem levantar os valores com juros.
Por meio de nota, o procurador da Fazenda Nacional Paulo Mendes informa que “há inúmeros precedentes favoráveis à tese da Fazenda Nacional nos TRFs, especialmente nos tribunais da 2ª e 4ª Regiões. A definição da tese em sede de repetitivo é bastante relevante, tendo em vista os vultosos montantes que são depositados em juízo pelos contribuintes”.
Para o ministro Mauro Campbell Marques, os juros devem ser tributados porque são remuneração ao contribuinte. “O fato gerador dos juros não decorre de mora da Fazenda Pública, mas da existência de depósito voluntariamente efetuado pelo contribuinte”, diz o ministro na decisão.
No caso das restituições de tributos pagos indevidamente, o ministro entendeu que os juros têm caráter de lucro cessante. Ou seja, representariam aquilo que o contribuinte ganharia se não tivesse que pagar os tributos. Dessa forma, diz o ministro, representam acréscimo ao patrimônio da empresa, “razão pela qual é legítima sua tributação pelo IR, salvo a existência de norma isentiva da verba principal”.
Para o tributarista Diego Miguita, do Vaz, Barreto, Shingaki & Oioli Advogados, a decisão não leva em conta o artigo 404 do Código Civil, que embasa acórdãos do próprio STJ. Segundo o dispositivo, os juros de mora têm caráter de indenização. “O entendimento vai contra o princípio da razoabilidade ao tributar um dinheiro que, ao invés de estar na sua conta, foi represado pelo Estado”, diz.
Advogados afirmam que a decisão do STJ poderá influenciar na discussão sobre a tributação de juros recebidos por empresas de cartão de crédito, varejistas, atacadistas, do setor elétrico e de telefonia em casos de inadimplência do consumidor. “Grandes empresas discutem o assunto, e possuem decisões favoráveis na primeira instância”, afirma Miguita.
Discussão na área trabalhista é polêmica
Os últimos dois anos foram marcados por idas e vindas na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a tributação de juros de mora decorrentes de verbas trabalhistas. No dia 22, a 1ª Seção da Corte, ao retomar um julgamento interrompido em fevereiro de 2011, decidiu que um trabalhador do Rio Grande do Sul deve pagar Imposto de Renda (IR) sobre juros de mora de verbas trabalhistas. A decisão foi por maioria de votos. “No caso, não há notícia de que as verbas sejam decorrentes de despedida”, afirmou o ministro Benedito Gonçalves, que proferiu o voto-vista.
Segundo o ministro, a decisão estaria em sintonia com o recurso repetitivo sobre o assunto julgado pela Corte em setembro de 2011. Na ocasião, a seção fixou a tese e orientou os tribunais de que, nesses casos, não incidiria IR por causa da natureza indenizatória dos juros de mora, relativos a atraso no pagamento. Mas em fevereiro, provocada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a Corte esclareceu que a isenção só alcançaria verbas trabalhistas indenizatórias – abono de férias e aviso prévio, por exemplo – decorrentes de condenação judicial.
Em outubro, ao analisar outro caso sobre o mesmo assunto, a 1ª Seção estabeleceu uma nova interpretação. Para a maioria dos ministros, os juros de mora são tributados, exceto quando o funcionário perde o emprego ou quando a verba recebida na rescisão do contrato é isenta do IR, como o FGTS. “O julgamento chocou-se com a interpretação proferida no recurso repetitivo”, diz o advogado Carlos Golgo, do Carlos Golgo Sociedade de Advogados. “Não há qualquer segurança jurídica.”
O entendimento contraria ainda a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Em agosto de 2009, o Órgão Especial da Corte definiu, com base no artigo 404 do Código Civil, que os juros são indenizações ao trabalhador, logo isentos de tributação.
O Congresso Nacional também analisa a questão, por meio de um projeto de lei que proíbe a tributação. A proposta, já aprovada pelo Senado, aguarda apreciação da Câmara dos Deputados. Pelo projeto, o trabalhador não precisaria recolher o imposto sobre os juros recebidos “pelo atraso no pagamento de remuneração decorrente de exercício de emprego, cargo ou função”. (BP)
Fonte: Valor Econômico / por Fenacon
Escrito por: Bárbara Pombo
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