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Fim do IOF para resgate de CDB pode afetar captação de bancos

10/01 – Um decreto editado pelo governo no apagar das luzes de 2010 vem provocando controvérsia no mercado bancário. Desde o dia 3 de janeiro, aplicações em títulos privados de renda fixa que sejam resgatadas ou revendidas antes de 30 dias corridos estão isentas de Imposto Sobre Operação Financeira (IOF) sobre o rendimento. A penalidade permanece válida somente para títulos públicos.

A medida, idealizada para incentivar o mercado secundário de papéis como debêntures e letras financeiras, terminou por atingir diretamente -e de forma indesejada, para a maioria dos bancos – os Certificados de Depósito Bancário (CDBs), maior fonte de captação de recursos dos bancos, com um estoque de R$ 896 bilhões. Isso porque, ao contrário das debêntures, os CDBs costumam oferecer aos clientes liquidez diária. Na prática, entretanto, acabavam ficando depositados nas instituições por pelo menos 30 dias por causa da penalidade imposta pelo IOF.
“Parece um incentivo à volta overnight”, diz Luiz Marcelo Moraes, diretor de negócios de tesouraria do Itaú Unibanco . O receio, principalmente de bancos pequenos e médios, é de que a medida estimule a liquidez diária e exerça pressão sobre sua principal fonte de captações.
“O esforço recente do governo é de pedir para os bancos melhorarem a gestão de seus ativos e passivos, casando o prazo de ambos. Mas o decreto veio no sentido contrário” , diz Renato Oliva, presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), que reúne instituições de pequeno e médio portes.
Em nota à imprensa, o Ministério da Fazenda explica que a isenção de IOF tem por objetivo desenvolver o mercado secundário de títulos privados, já que a tributação afetava também a revenda dos papéis. “As debêntures sempre foram penalizadas com essa tributação”, diz Álvaro Augusto Vidigal, presidente do Banco Paulista . Segundo ele, a isenção de IOF para o resgate antecipado desses títulos é um pleito antigo do setor. “Achei a medida ótima. Agora o mercado pode andar com as próprias pernas.”
A ausência de um mercado secundário, no qual o investidor possa revender debêntures, é apontada como um dos principais entraves para o fomento ao crédito privado no país. “Como o investidor é praticamente obrigado a manter a aplicação até o vencimento, a tendência é que ele compre menos ou simplesmente não compre”, observa Mauro Rached, diretor de wealth management do BNP Paribas . “Isso acaba fazendo com que a empresa pague um prêmio maior para atrair recursos e financiar seus projetos de longo prazo.” O raciocínio vale não só para debêntures mas também para letras financeiras e Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs).
O mal estar provocado pela medida talvez tenha ocorrido, na avaliação de Rached, por sua abrangência. O mercado reivindicava a desoneração das debêntures, mas foi surpreendido pela isenção do IOF sobre todos os títulos privados. O estoque atual de debêntures é R$ 338 bilhões, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), bem inferior ao de CDBs.
“Será que para estimular o mercado secundário de debêntures o prazo de 30 dias é tão fundamental?”, questiona Oliva, da ABBC. A entidade está fazendo alguns estudos para entregar ao Ministério da Fazenda e ao Banco Central mostrando os impactos negativos que a liquidez diária para os CDBs pode trazer aos bancos.
Alguns executivos avaliam que a medida deve atingir mais fortemente os bancos médios. “Para um banco grande, oferecer resgate diário pode ser um atrativo para ganhar o cliente, e isso não vai fazer diferença na estrutura de captações dele. Mas para os bancos de menor porte, sim”, diz o diretor de um banco. Diante da incerteza, muitas instituições financeiras podem preferir deixar o dinheiro parado em vez de conceder empréstimos, já que não podem antever quando o cliente pedirá resgate.
Os bancos pequenos e médios já vinham reduzindo a oferta de CDBs com liquidez diária, o que evidenciaria mais um sinal de descompasso entre o mercado e a medida do governo. “Desde 2008, com a crise, deixamos de oferecer CDB com liquidez diária. Não adianta ter uma captação desse tipo se o crédito consignado que eu vendo tem prazo médio de dois anos e meio”, conta Jorge Lipiani, diretor executivo do Bonsucesso .
Mas a retirada do IOF pode criar um novo mercado de CDBs com prazo de até 30 dias. As empresas estariam entre as principais interessadas, já que existem pouquíssimas alternativas de remuneração de curto prazo para seus caixas. Por conta da demanda corporativa “reprimida”, há quem aposte, inclusive, em uma disputa sobre esses recursos que, normalmente, ficam parados em conta corrente.
A Caixa Geral de Depósitos já começou a anunciar a boa nova a seus clientes. “Procuramos vários, e a maioria sequer sabia da possibilidade que foi aberta”, diz Fábio Raposo, tesoureiro do banco. “O retorno tem sido positivo, conseguimos inclusive algumas aplicações.” Raposo não acredita que haverá pressão significativa sobre as captações. Ao contrário de muitos colegas, ele entende que a retirada de IOF para resgates antecipados de títulos privados pode até trazer benefícios para os bancos, como a queda das taxas dos CDBs.
“O ‘benchmark’ para aplicações de curtíssimo prazo é sempre muito abaixo do CDI, a exemplo do que ocorre com as LCAs [Letras de Crédito do Agronegócio]”, explica. Esse movimento descendente, porém, tenderia a ocorrer no médio prazo, segundo Raposo. “Por conta do aumento do recolhimento de depósito compulsório, os bancos, no momento, estão preocupados em recompor a liquidez.”
Entre as pessoas físicas, o apelo da nova medida tende a ser baixo – não valeria a pena sacar o dinheiro para trocar por um CDB de outro banco, mais rentável, justamente porque as taxas praticadas pelas instituições para esse público são semelhantes. “Esse é um mercado com pouca variação de preço e no qual conta muito o relacionamento do banco com o cliente”, diz Edson Franco, superintendente de investimentos do Santander .
Por enquanto, nenhum banco sentiu, no dia a dia, pressão por resgates, até porque a medida é recente. Os únicos inconvenientes ocorridos, até agora, foram de ordem técnica. “Tivemos de colocar uma equipe de plantão no fim de ano só para ajustar os processos e evitar que fosse aplicada a tabela regressiva de IOF sobre os resgates na primeira semana de 2011”, conta Moraes, do Itaú.
O advogado tributarista Renato Batiston, associado sênior do escritório Souza, Cescon , lembra que o IOF nas aplicações com prazo inferior a 30 dias foi criado em 1999, quando o governo notou que os investimentos estavam sendo feitos por períodos muito curtos.
Fonte: Valor Econômico / por Fenacon
- 10 de janeiro de 2011
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