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Na contramão da política de juros, governo sobe gastos

23/05 – Enquanto o Banco Central eleva juros para esfriar a economia e conter a inflação, a Fazenda e o Planejamento anunciam mais gastos públicos para estimular o consumo e o investimento.
Finalmente anunciadas ontem, as metas para as contas do Tesouro Nacional sinalizam despesas recordes –que podem aumentar ainda mais até dezembro.

Ao apresentar os dados, o ministro Guido Mantega (Fazenda) contestou, na prática, o diagnóstico do BC de que menos economia do governo (o afrouxamento da política fiscal) alimenta a inflação.
Segundo a tese de Mantega, a alta dos preços está concentrada em alimentação e serviços –e portanto não estaria ligada ao gasto público.
Ainda segundo o ministro, pretende-se elevar os investimentos, e não o custo da máquina administrativa.
O afrouxamento fiscal começa pela redução do montante a ser poupado para o abatimento da dívida pública, ou superavit primário. Em vez dos R$ 108,1 bilhões planejados no início da elaboração do Orçamento, o objetivo passou a ser R$ 63,1 bilhões.
Com a medida, os gastos com pessoal, custeio administrativo, programas sociais e investimentos subirão de R$ 805 bilhões, em 2012, para R$ 938 bilhões, ou de 18,3% para 19,2% do PIB, maior patamar da história.
Mas o governo criou brechas que, no limite, permitem reduzir o superavit a R$ 42,9 bilhões e elevar as despesas totais a R$ 948 bilhões. Graças às metas menos ambiciosas, pode-se reduzir o ajuste anual na lei orçamentária aprovada pelo Congresso.
Nos dois primeiros anos de mandato de Dilma, houve bloqueios de despesas na casa dos R$ 50 bilhões. Agora, o valor caiu a R$ 28 bilhões.
Inflação
A expansão do gasto público tem sido apontada pelo BC como um dos motivos para a alta da inflação. Quando o governo eleva salários, benefícios, compras e obras, a demanda por bens e serviços cresce mais rapidamente que a oferta e pressiona os preços.
Até aqui, o BC tem fixado os juros com base em uma estimativa oficial de superavit primário de União, Estados e municípios de 3,1% do PIB.
As metas fiscais anunciadas ontem, no entanto, apontam para um superavit de 2,3% do PIB, considerando que governos regionais pouparão 1% do PIB, o que não acontece desde 2008. Nos últimos 12 meses, os superavit estaduais e municipais ficaram em 0,4% do PIB.
Parte das emendas parlamentares sobrevive aos cortes do Planalto
Com a política de generosidade fiscal, o governo pôde preservar parte das vítimas preferenciais dos cortes de gastos: as despesas incluídas no Orçamento federal por deputados e senadores.
Conhecidas como emendas parlamentares, elas somam R$ 22,7 bilhões na lei orçamentária, dos quais R$ 7,1 bilhões ficarão liberados, segundo a ministra Miriam Belchior (Planejamento).
O desembolso desses recursos, normalmente voltados a obras de pequeno montante nas bases eleitorais dos congressistas, costuma ser condicionado ao apoio a projetos de interesse do Executivo, como a MP que modificou as regras dos portos.
Aliados e oposicionistas no Congresso aproveitaram a ocasião para defender a proposta que torna obrigatória a execução integral das emendas parlamentares.
O líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), que combateu o texto aprovado da MP do Portos, disse que não é surpresa o corte promovido. “Quanto mais cortar, mais fácil fica para aprovar [a execução obrigatória das emendas].”
Para o líder do PT, José Guimarães (CE), o governo moderou no contingenciamento por entender que a maior parte das emendas está ligada a investimentos.
Já o líder do PSDB, Carlos Sampaio (SP), disse que o governo erra na tesourada. “É um absurdo cortar investimentos em vez de cortar gastos com a máquina, os cargos para a companheirada.”
Análise Política Fiscal

Receita não será suficiente para atender a desafio fiscal
André Perfeito
Especial para a Folha
A avaliação bimestral das receitas da União realizada ontem pelos ministros da Fazenda e do Planejamento trouxe mais ruído na administração econômica do país.
Na apresentação, ficou claro que as receitas simplesmente não serão suficientes para dar conta do desafio fiscal de maneira adequada.
A revisão apontou R$ 47,5 bilhões a menos do que o previsto, redução esta puxada pela queda na arrecadação prevista do IPI (-R$ 13,6 bilhões), do Imposto de Renda (-R$ 14,1 bilhões) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (-R$ 10,1 bilhões).
Essa queda era espera- da, afinal, atividade em ponto morto força receita para baixo e, com incentivos fiscais na ponta do lápis e na ponta da língua, não é estranha essa revisão.
O que preocupa é a potencial descoordenação de va- riáveis-chave da economia e, sob esse aspecto, o relatório de ontem deixa muito a desejar.
A primeira questão é que o superavit primário virou uma espécie de ficção, de tantos abatimentos possíveis nos meandros do Orçamento.
A meta fiscal fixada na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2013 previa cerca de R$ 156 bilhões para o primário, mas, deste valor, o Congresso já deu um desconto de cerca de R$ 45 bilhões para o PAC e de outros R$ 20 bilhões em desonerações.
Subtraia disso a não obrigação de compensar as metas dos Estados e dos municípios e poderemos ter um superavit de modestos R$ 43 bilhões.
O ministro Guido Mantega também anunciou ontem um corte de R$ 28 bilhões no Orçamento, numa tentativa de ordenar a política fiscal brasileira, mas esse corte soou tímido frente à queda da arrecadação.
Basta lembrar os esforços de R$ 50 bilhões de 2011 e de R$ 55 bilhões de 2012 para colocar os R$ 28 bilhões em seu devido lugar.
A impressão que se passa é que a política anticíclica da Fazenda irá resultar num superavit, na melhor das hipóteses, medíocre.
O problema não acaba por aí. Não bastassem todos esses reveses na política fiscal, o Ministério da Fazenda aponta que trabalha com a hipótese de que o PIB de 2013 será de 3,5%.
Essa previsão joga um balde de água fria em todas as outras projeções de receita, excetuando, é claro, a do próprio superavit, que nesse caso seria maior em termos nominais.
É muito pouco provável que o PIB brasileiro suba tanto neste ano.
Para atingirmos esse valor, o PIB terá que subir 1,1% por trimestre (lembramos que a média dos últimos dois anos foi de modesto 0,35% por trimestre).
Vai sobrar para o Banco Central arrumar tudo isso semana que vem via Selic.
Não será fácil.
André Perfeito é economista-chefe da Gradual Investimentos.
Fonte: Folha de S.Paulo / por Fenacon
Escrito por: Gustavo Patu
- 23 de maio de 2013
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