29/04 – Mais do que um fôlego extra, a implementação de um programa de redução de custos pode constituir uma chance única de ampliar a margem de lucros. Cortar gastos nem sempre significa apenas economizar. Pelo contrário, desinflar as contas e fazer mais com menos é um dos principais diferenciais na estratégia competitiva de grandes e pequenas empresas e também é uma forma de ampliar a geração de receitas e a capacidade de investimentos.
Considerado por alguns empresários como um mal necessário, a correta implementação de um programa de redução de custos pode garantir a sobrevivência e ser fundamental para as estratégias de competividade de uma empresa. Independentemente do porte do negócio, a atenção redobrada nos desperdícios, a alteração de processos e a qualificação dos serviços podem garantir cortes de até 100% nos gastos.
De olho nessa necessidade, empresas especializadas e com metodologia aplicável a qualquer segmento econômico passaram a vender economia no mercado. Em média, costumam obter cerca de 20% de abatimento nas contas, e a cobrança é feita com base no próprio desconto. O resultado dá um fôlego extra para os investimentos e a amplia a margem de lucro.
Uma recente pesquisa da consultoria norte-americana Bain, realizada com cerca de 300 executivos, revela que em 2008 e 2009 muitas corporações reagiram à crise financeira com várias iniciativas para redução de custos. Entretanto, o índice de satisfação com os resultados foi baixo e 40% dos consultados afirmaram que não foram bem-sucedidos em seus objetivos.
Por outro lado, entre 68 grandes empresas, 20% conseguiram manter ou aumentar o seu EBITA (lucros antes de juros e impostos), apesar de queda de 10% ou mais no faturamento no auge da recessão.
No entanto, os que alcançaram os objetivos propostos, conforme identifica o sócio da Bain Company no Brasil, Alfredo Pinto, repetem quatro pontos essenciais em suas estratégias: métricas corretas, foco na organização, adequação à missão empresarial e definição de objetivos com base em dados do mercado externo.
Na avaliação do especialista, um dos erros mais recorrentes diz respeito ao fato de muitas empresas começarem o planejamento com um número redondo a ser alcançado – como 10% ou 20%. Contudo, essa definição é arbitrária e vinculada às referências internas, principalmente, nos casos em se verificam crescimentos de receita modestos, pressão nos custos e, por consequência, uma expressiva corrosão da margem.
“Nem sempre a redução dos custos está ligada à diminuição dos gastos, fazer mais com menos também é uma forma de economia, e a geração de receitas pode estar ligada ao aumento da qualidade. Não é uma redução que tem a ver apenas com o corte, mas, sim, à otimização dos resultados. Quando há essa economia, isso se torna um diferencial competitivo”, analisa.
O fato é ilustrado, na pesquisa da Bain Company, pela experiência de uma grande companhia aérea, cujo call center é ponto de contato com seus clientes e desempenha o papel de oferecer serviços com qualidade diferenciada. O setor crítico passou por uma terceirização com uma abordagem focada em custos. Já no primeiro mês, o número de chamadas abandonadas aumentou em 30% e a conversão em vendas despencou 2%.
Após identificar a raiz dos problemas de desempenho e redefinir o modelo, a companhia reavaliou a opção. Um ano depois da correção de curso, os custos foram ampliados em 10%, no entanto, a venda bruta de bilhetes aumentou em mais de 50% e a quantidade de ligações atendidas em menos de 30 segundos chegou a 90%. Em síntese, explica o consultor, “os ganhos muitas vezes acabam compensando o aumento de custos operacionais”.
Pinto ainda chama a atenção para a necessidade de escolher o momento certo de planejar. Segundo ele, os proprietários têm por hábito acordar para a questão apenas em situações de anormalidade contábil. Ao perceberem a redução da margem nos balanços, também se inaugura a crença de que os resultados melhorarão no próximo exercício fiscal. Porém, a condição pode se repetir e introduzir uma rota perigosa a ser trilhada. E o saldo deste período que se supõe passageiro exige como primeira reação a remarcação de preços. Na expectativa de compensar a pressão, o quadro pode ser deteriorado e trazer reflexos negativos, algumas vezes irreversíveis, para a competitividade do negócio.
“Inaugura-se uma estrada da morte, porque além da perda de crescente de mercado, cada vez menos se consegue ganhar volume para promover a esperada recuperação, o que traz à tona a necessidade de uma resposta consistente também aos acionistas, que podem chegar a uma conclusão arriscada sobre a falta de remuneração adequada ao capital que foi empregado num determinado negócio. Tudo isso é fruto da pura falta de coragem de encarar os custos de frente”, alerta.
Maior incidência de desperdícios está em áreas não estratégicas
Quando uma empresa se conscientiza da importância de ter competitividade em custos, surge a dúvida sobre as melhores formas de atingir as proposições. O fato constitui um dos grandes desafios da administração na atualidade. No entanto, especialistas no assunto são unanimes em afirmar que as maiores economias são encontradas no corn business, ou seja, no negócio central, e, sim, em áreas secundárias da organização.
É o que explica Fernando Macedo, especialista em redução de gastos da ERA (Expense Reduction Analysts), consultoria de origem inglesa com atuação no Brasil desde 2009. De acordo com ele, os “ralos” costumam estar escondidos nos desperdícios de setores adjacentes e até mesmo em fraudes e no baixo desempenho dos colaboradores. O resultado, em qualquer uma das hipóteses, é o mesmo: alto comprometimento do caixa.
Identificar os gargalos, no entanto, nem sempre é uma tarefa fácil e visível aos olhos dos empreendedores. Por isso, a elaboração de um projeto consistente deve obedecer a uma metodologia fundamentada em check list, entrevistas, análises segmentadas e avaliação de rivais no mercado.
Ao longo do processo não existem fórmulas mágicas e cada programa é feito de modo singular.
Existem exemplos, inclusive, de concorrentes diretos e projetos totalmente distintos. De acordo com Macedo, outro detalhe característico é que não deve haver interesse na troca de fornecedores, ao contrário do que pensam alguns empresários. Historicamente, mais de 70% dos projetos da empresa terminam com a permanência dos prestadores de serviços que obrigatoriamente participam de todo o processo.
As melhores práticas, comenta o consultor, também precisam respeitar as determinações dos clientes. “Economizar jogando a qualidade para baixo é um erro. Além disso, não podemos nos chocar contra a política corporativa da empresa”, afirma. Ao identificar questões vinculadas à gestão e que acabam determinando os desperdícios, ele ressalta que a proposta deve focar em itens não ligados ao negócio principal, pois “não se pode ensinar uma siderúrgica a trabalhar com aço ou uma indústria automotiva a fazer carros”.
Por isso, a saída é abordar repetições comuns em todas as empresas como limpeza, saúde, segurança, seguros, fretes, gastos de viagem. No entanto, uma característica que ocorre no Brasil e costuma ser recorrente em outras partes do mundo diz respeito aos gastos excessivos em telecomunicações, o grande campeão dos percentuais e valores nominais das reduções.
“É uma área dinâmica, com uma carga tecnológica grande e um nível baixo de regulamentação. Sempre conseguimos bons resultados. É algo mais conjuntural do que setorial. O volume de itens cruzados em telefonia móvel se sobressai aos da telefonia fixa, em razão do volume e das variantes. Há contratos de pacotes que pregam algumas peças nas empresas e podem ser revertidos em economia e lucros”, revela.
Controle em limpeza, segurança e alimentação economiza até R$ 5 milhões
A disseminação dos programas de qualidade nas corporações gaúchas costuma constituir uma peculiaridade. A constatação é feita pelo Diretor Unidade de Negócios da ERA no Estado, Eduardo Natan Hess. Segundo ele, “quanto mais competitivo o segmento, mais interessante se tornam os resultados obtidos”.
A Iochpe-Maxion – companhia com origem no Rio Grande do Sul e que atualmente atua nos segmentos automotivo e ferroviário com mais de 8 mil empregos gerados em sete unidades fabris, localizadas no Brasil e no exterior – não foge à regra. Conforme explica o diretor financeiro José Ponciano, a norma é estar aberto a esse tipo de iniciativa. Por isso, em alguns casos, não é preciso sequer esperar um ponto crítico para dar início aos programas setoriais, ao contrário do que ocorre em muitas empresas.
Ponciano afirma que o principal atrativo de um projeto de redução de custos é o “risco zero”. Isso porque os contratos são fechados com base na economia. “Se obtivermos cortes, todos saem ganhando. Se não obtivermos, a empresa não tem gasto algum. Então não existem motivos para não tentar. Fora o fato de que as empresas que prestam esse serviço possuem conhecimento específico de determinadas áreas, inclusive no que se refere aos tributos”, sintetiza.
O executivo relembra um dos planos implementados há cerca de três anos com foco em três setores adjacentes: limpeza, segurança e restaurantes. O resultado das reduções que variaram entre 20% e 30% dos gastos em cada uma das áreas foi um corte total de cerca de R$ 5 milhões ao ano – uma economia obtida com alterações simples como padronização de horários, instalação de catracas e mudanças na cozinha. “Eliminamos uma série de coisas desnecessárias, e a redução de custos ainda determinou em melhoria significativa no padrão do restaurante”, exemplifica.
Agora, a empresa se prepara para implantar um projeto semelhante para promover melhorias no setor de embalagens. Após as primeiras análises, a expectativa, comenta Ponciano, é chegar a um corte superior a R$ 800 mil ao ano.
Implantação de softwares acelera processos e diminui tempo e custos de produção
A utilização de tecnologia no processo de redução de gastos ganha espaço dentro dos planejamentos estratégicos. Muitas vezes, esse tipo de economia pode ser mensurado na redução do tempo gasto e na agilidade dos processos. É o que ocorre na Dismat, fabricante de brinquedos de Bento Gonçalves. Há dez anos a empresa acompanha o desenvolvimento do Software Cimatron E11, que congrega as plataformas CAD/CAM para a produção de moldes, matrizes de estampo e manufatura de peças.
Com 40 mil softwares instalados em todo o mundo, o gerente da companhia no Brasil Alexandre Censi afirma que as vantagens formam uma via de mão dupla, pois o aumento de produtividade fica em média entre 30% e 40%. Além disso, a lucratividade está associada com a redução no prazo de entrega de um molde que pode cair de 90 para 60 dias. “Na área de moldes, toda a parte de canais de refrigeração, extratores e gavetas é feita de forma automática, o que libera o projetista para focar a experiência no que ele realmente sabe. Se precisa desenhar 50 parafusos em um molde, é muito tempo gasto. Ao identificar e resolver esses gargalos há economia no tempo e reflexo direto no lucro”, defende.
A experiência é vivida na prática pelo projetista da Dismat, Roberto Vicenzi. Segundo ele, o programa permite acompanhar alterações na modelagem ou na produção, o que evita um processo que anteriormente era feito com repetições e testes. “Agora no momento em que se apresenta um brinquedo, já é possível calcular o peso, as medidas exatas nas curvas mais críticas do processo design, e custo unitário aproximado em razão da quantidade de matéria-prima necessária”, revela. Segundo o projetista, apesar de não ser uma demanda explícita dos custos, a segurança e a agilidade acabam incidindo diretamente sobre o aumento de receitas.
Fonte: Jornal do Comércio
Escrito por: Rafael Vigna
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