Interesse dos empresários sobre socorro judicial dispara e escritórios de advocacia vêm demanda triplicar
Após recuar durante a pandemia – graças às medidas oficiais para mitigar os efeitos da desaceleração econômica sobre a saúde financeira das empresas -, o número de consultas sobre recuperação judicial voltou a subir com a guerra entre Rússia e Ucrânia. Essa é uma das consequências que são sentidas em nível global, a começar pelo aumento do preço dos combustíveis.
Nas últimas semanas, triplicou o número de consultas ao processo de socorro judicial em escritórios de advocacia especializados.
“Diante desse cenário desafiador é fundamental que o empresário brasileiro avalie a saúde financeira do próprio negócio e a capacidade de resiliência neste momento de crise, e analise se está na hora de ingressar com um pedido de recuperação judicial, antes que seja tarde demais”, alerta o advogado Alcides Wilhelm.
Na avaliação do especialista, a guerra pode acelerar o estouro de uma bolha que vem inflando desde o começo da pandemia, quando muitas empresas passaram a gozar de benefícios, como a suspensão temporária das obrigações com os credores, o adiamento dos prazos para pagamentos de tributos e linhas de crédito facilitadas.
Esse conjunto de medidas fez encolher o número de pedidos de recuperação judicial nos últimos dois anos, de acordo com dados do Serasa Experian. Em 2020, as solicitações recuaram 15% em relação ao ano anterior e, se mantiveram no mesmo patamar em 2021.
“Isso depende de vários fatores, como o fato de credores e devedores estarem mais dispostos a negociarem extrajudicialmente e pela maior disponibilidade de linhas de créditos num momento de crise. Porém, uma hora a conta chega e é importante que o empresário perceba se ele conseguirá pagar ou se é melhor recorrer ao instrumento da recuperação judicial”, explica o advogado.
Embora ainda seja vista por alguns, de forma equivocada, como um atestado de incompetência, a recuperação judicial é na verdade uma poderosa ferramenta legal capaz de salvar da falência empresas que passam por momentos de crise, seja por problemas internos de gestão ou por fatores externos.
A guerra na Ucrânia, que desencadeou um maciço pacote de sanções econômicas aplicadas pelo Ocidente à Rússia, está provocando um duro choque na economia mundial, justamente agora que ela vinha mostrando sinais de recuperação, após o forte abalo causado pela pandemia.
De duração imprevisível, o conflito jogou um balde de água fria no comércio internacional, com efeitos sísmicos que já estão sendo sentidos no Brasil e que inevitavelmente afetam as empresas nacionais de qualquer tamanho. O preço do barril do petróleo chegou a bater 139 dólares nos últimos dias e analistas calculam que o preço interno da gasolina pode chegar a R$ 10 o litro.
Com uma economia de tamanho parecido com a brasileira, a Rússia é uma grande produtora e exportadora de matérias-primas como petróleo, gás e grãos, mas também de fertilizantes, que suprem boa parte da demanda interna do Brasil.
A inevitável alta dos preços dos combustíveis, aliada à redução das exportações de matérias-primas russas, tem reflexos sobre toda a cadeia global do comércio, que sofrerá, ainda no curto prazo, com o encarecimento do custo da energia, a escassez de produtos e elevação dos custos logísticos.
O momento certo para pedir RJ
Como muitos empreendedores consideram a recuperação judicial um atestado de fracasso, o principal erro das empresas é recorrer à ferramenta legal com atraso, o que pode comprometer irremediavelmente a saúde financeira do empreendimento.
“Essa visão distorcida da realidade é cultural no Brasil e vem causando enormes estragos às empresas, à economia e à sociedade em geral. Se o empresário não entender que a lei de recuperação é o caminho para salvar seu negócio, ele irá em busca de outras medidas para tentar resolver seus problemas, medidas estas, muitas vezes, de cunho duvidoso ou mesmo ilegal”, alerta o advogado Alcides Wilhelm, do escritório Wilhelm & Niels Advogados Associados.
Identificar o momento oportuno para ingressar com um pedido de socorro pode não ser tarefa fácil e cabe ao empresário – munido de informações contábeis, administrativo-financeiras, econômicas, de mercado, entre outras – perceber que seu negócio não resistirá ao cenário que está se formando.
“Deixar passar o momento ideal para ingressar com um pedido de recuperação judicial significa dizer que a empresa estará mais vulnerável econômica e financeiramente. Em alguns casos, não possuindo mais recursos em caixa, títulos a receber, estoques, bem como acesso a linhas de crédito, a recuperação corre o risco de ficar inviável”, explica Alcides Wilhelm.
Embora a missão de prever o futuro seja complicada, alguns sinais ajudam o empresário a entender se é hora ou não de buscar socorro judicial. São eles:
– o endividamento e os parcelamentos tributários, com fornecedores ou instituições financeiros, aumentaram;
– o faturamento diminuiu;
– a antecipação de recebíveis virou uma necessidade constante e pagar os compromissos em dia se tornou uma dificuldade recorrente;
– os estoques vêm se reduzindo paulatinamente.
Como funciona a recuperação judicial
“Quanto mais cedo a empresa ingressar com o pedido de recuperação judicial, maiores serão os índices de sucesso”, destaca o especialista, que lembra que o pedido de socorro judicial tem que ser deferido pela Justiça. Após aceito, a lei prevê algumas etapas.
1) A empresa recuperanda terá sua dívida “congelada” por um prazo de 180 dias, período em que não poderá pagar nenhum credor;
2) Os processos executivos são suspensos de modo que não será possível expropriar bens ou esvaziar o caixa da empresa por meio de penhoras ou leilões;
3) O devedor tem 60 dias, após o deferimento do processo, para apresentar o plano de recuperação judicial que deve conter as propostas de como realizará os pagamentos aos credores. O plano deve detalhar pedidos de deságio, carência, repactuação das taxas de juros e prazos mais longos para quitação, que variam de 8 a 12 anos, dependendo da situação de cada empresa.
4) A assembleia de credores decide sobre a proposta de recuperação apresentada pelo devedor e pode pedir alterações para buscar um consenso entre as partes que viabilize o soerguimento da empresa.
por Talk Comunicação
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