Artigo de Breno Lobato Cardoso*
12/05 – Sabe-se que o ICMS é imposto que visa evitar a tributação em cascata, razão porque a Constituição tornou obrigatória a observância do princípio da não-cumulatividade, de acordo com o art. 155, §2º(1) .
Dessa maneira, poderá o contribuinte abater do crédito tributário o que foi recolhido a título de ICMS anteriormente na cadeira produtiva, evitando, então, uma maior oneração da carga tributária decorrente da incidência cumulativa, que, vale lembrar, ao final acaba sendo suportada pelo consumidor.
A Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir), disciplina no seu art. 20 o instituto da não-cumulatividade, assegurando ao contribuinte o creditamento do imposto anteriormente cobrado em operações que tenham resultado entrada de mercadoria, inclusive a destinada ao uso, consumo e ativo permanente; ou ainda decorrentes de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.
Ocorre que, o art. 33 do mencionado diploma legal vem, sucessivamente, prorrogando o direito aos créditos das mercadorias destinadas ao uso e consumo do estabelecimento, que, hoje, somente poderá ser usufruído a partir de 1º de janeiro de 2020.
Pura ilusão, certamente em 2020 será aprovada nova lei postergando o prazo, como, registra-se, foi feito pela LC 92/1997 (01/01/2000), LC 99/1999 (01/01/2003), LC 114/2002 (01/01/2007), LC 122/2006 (01/01/2011) e, finalmente LC 138/2010 (01/01/2020).
Muito discutido na doutrina é validade constitucional dessa procrastinação ao direito de crédito de mercadorias para o uso e consumo, que violaria as disposições constitucionais sobre o tema, vale citar, por todos, Roque Antonio Carraza(2) .
Infelizmente, a jurisprudência dos Tribunais Superiores admite essa postergação, de modo que, hoje, os contribuintes são impedidos de creditar-se das entradas de mercadorias destinadas ao uso e consumo, conforme precedentes do STF: RE 503877 AgR/MG, RE 588985 AgR/RS, AI 677610 AgR/SP.
Com base nesse argumento e com o apoio da jurisprudência o Fisco vem impedindo que as empresas de transporte se creditem de peças de veículos utilizados no transporte, óleo diesel, lubrificantes, pneus, etc.
No entanto, essas mercadorias para as empresas de transporte representam nítido INSUMO – ao invés de uso e consumo – essencial à atividade do contribuinte, que tem o direito de creditar-se com base no art. 20, §1º da Lei Kandir(3) .
Há de se esclarecer que antes da Lei Complementar nº 87/1996, a questão era regulada pelo Convênio 66/1988, o qual somente admitia o creditamento relativo a insumos se estes fossem consumidos no processo industrial ou integrassem o produto final na condição de elemento indispensável de sua composição.
Ocorre que, a Lei Kandir trouxe nova disciplina ao tema, exigindo para o creditamento de insumos – com base do art. 20, §1º – tão somente que a mercadoria seja essencial ao estabelecimento, não exigindo mais que integre o produto final.
Com base nesse entendimento, o STJ, por mais de uma oportunidade, assegurou a empresas de transporte o direito a creditar-se de peças de veículos, lubrificantes, óleo diesel, pneus, etc., desde que essas mercadorias fossem imprescindíveis a atividade-fim da empresa, como se pode atestar do REsp 1175166/MG e REsp 1090156/SC.
Na 6ª Vara de Fazenda da Comarca de Belém já existe precedente assegurando a uma empresa de transporte o creditamento de óleo diesel, já que é insumo dessa atividade, ao invés de bens destinados ao uso e consumo como defendido pelo Fisco (processo nº 0010564-55.2008.814.0301).
Dessa maneira, conclui-se que as empresas de transporte o direito líquido e certo a, de acordo com o princípio da não-cumulatividade, creditar-se de todos os insumos essenciais ao desenvolvimento da sua atividade fim, tais como: óleo diesel, peças, lubrificantes, pneus, etc.
Notas
(1) “§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
I – será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;
II – a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:
a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;
b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores;”
(2) CARRAZA, Roque Antonio. ICMS – 12ª Ed – São Paulo: Malheiros, 2007.
(3) “Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.
§ 1º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento”.
*Breno Lobato Cardoso – Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Pará-UFPA, Pós-graduando em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas-FGV-Pará.
Fonte: FiscoSoft
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